No aniversário de cinco anos da Operação Lava-Jato, em março de 2019, integrantes da força-tarefa instalaram um outdoor na entrada de Curitiba, cidade que se notabilizou como o centro das investigações do maior escândalo de corrupção do país. O painel dizia: “Bem-vindo à República de Curitiba. Terra da Operação Lava-Jato, a investigação que mudou o país. Aqui a lei se cumpre. 17 de março — 5 anos de Operação Lava-Jato — O Brasil Agradece”.
O momento era de grande popularidade do coordenador da Lava-Jato, Deltan Dallagnol, e do já ex-juiz Sérgio Moro, que, àquela altura, abrira mão da magistratura para assumir o cargo de ministro da Justiça e Segurança Pública do governo do presidente Jair Bolsonaro, o político que mais ganhou com o sucesso da operação de Curitiba. Lula cumpria pena na mesma cidade, condenado a 12 anos e um mês em regime fechado, por Moro, em denúncia elaborada por Deltan e seus colegas do Ministério Público Federal.
Cinco anos depois, o país chega, no próximo domingo, aos 10 anos da primeira fase da Operação Lava-Jato. E uma reviravolta tomou conta da história. A começar pelo outdoor. O procurador Diogo Castor de Mattos, que pagou pela instalação da propaganda, foi condenado pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) à perda do cargo, mas se mantém na função, por decisão judicial. Deltan viu as chances de ser também punido crescerem e se desligou do cargo. Elegeu-se deputado federal, mas teve o mandato cassado pela Justiça Eleitoral.
O senador Sergio Moro (União-PR) pode ser o próximo. O julgamento do ex-juiz está marcado para ocorrer a partir de primeiro de abril, no Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE-PR), por abuso de poder econômico e fraude eleitoral. Ele responde por duas ações de investigação judicial eleitoral, apresentadas pelo PL, partido de Jair Bolsonaro, e pela Federação Brasil da Esperança, composta por PV, PCdoB e PT, do presidente Lula.
Está em jogo o futuro político de Moro e já se fala em cassação da chapa e nova eleição no Paraná. Ciente da dificuldade, Moro e seu grupo pensam em lançar a deputada federal Rosangela Moro (União-SP) como candidata em substituição ao marido.
Certo é que a Lava-Jato afundou. Os dois maiores críticos dos métodos de Moro e Deltan, o advogado Cristiano Zanin e o ex-ministro da Justiça Flávio Dino, viraram ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Bolsonaro perdeu a eleição, a elegibilidade e ainda está sob investigação por atentar contra a democracia.
Na avaliação de advogados, integrantes do Ministério Público e policiais, a onda começou a se voltar contra a Lava-Jato quando Moro deixou o gabinete da 13ª Vara Federal de Curitiba para se tornar político. Essa postura alimentou a narrativa da defesa de Lula de que todas as ações foram analisadas com viés político. Ficou difícil rebater o discurso à medida que Moro se aproximava dos partidos de oposição à esquerda.
A invasão no telefone de Deltan também incrementou os argumentos da defesa dos réus e condenados de que havia um suposto conluio entre Moro e o Ministério Público Federal. Os elementos que surgiram na ação criminosa no Telegram de Deltan criaram um clima negativo que contaminou a opinião pública e motivaram vários recursos contra condenações. Pouco a pouco os processos foram sendo derrubados.
Apesar do revés, a Lava-Jato revelou muitos crimes. Em 10 anos, os cofres públicos recuperaram R$ 2 bilhões, segundo levantamento do ministro Edson Fachin. Mas hoje nenhum dos principais alvos está preso: Marcelo Odebrecht, Eduardo Cunha, Sergio Cabral, José Dirceu, Lula, diretores da Petrobras.
Tudo começou numa manhã, em 17 de março de 2014. A Polícia Federal deflagrou uma operação contra lavagem de dinheiro em seis estados (Mato Grosso, Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo) e no Distrito Federal, com 81 alvos de mandados de busca e apreensão em investigação de crimes como contrabando, tráfico de drogas e câmbio clandestino. Parte do dinheiro da organização criminosa era transferida para uma rede de lavagem de carros de postos de combustível. Assim surgiu a Operação Lava-Jato.
A investigação foi muitas vezes comparada com a Operação Mãos Limpas, da Itália, coordenada pelo Procurador da República Antonio Di Pietro, que desbaratou um enorme esquema de corrupção infiltrado nas instituições, a partir de agosto de 1992. No auge da Lava-Jato, procuradores brasileiros ouviram de um profundo conhecedor dos desdobramentos da Mãos Limpas o que seria a morte para a credibilidade do trabalho de investigação: o suicídio de alvos, o envolvimento de investigadores com a política e com eleições e o foco em todas as instituições ao mesmo tempo. Receita do que aparentemente ocorreu também no Brasil.
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