Jogo Sujo

Violação dos direitos humanos e suspeições mancham a nova carteira de identidade

MPF apura denúncias de entidade da comunidade LGBTQIA+. Requisitos discutidos no governo Bolsonaro alimentam suspeitas em relação à futura contratação das empresas que produzirão o documento 
 
O governo Bolsonaro deixou a identidade do brasileiro sub judice. O processo de implantação do novo RG – a Carteira de Identidade Nacional (CIN) – acumula um sem-número de problemas, de denúncias de violação de direitos humanos a suspeições em relação aos requisitos para a contratação das empresas encarregadas da produção do documento. O Ministério Público Federal publicou na última sexta-feira, dia 18, um parecer favorável à suspensão da confecção da CIN (https://editalconcursosbrasil.com.br/noticias/2022/11/novo-rg-pode-ser-suspenso-em-todo-pais-a-pedido-da-procuradoria/). O MPF apura denúncias de entidades representativas da comunidade LGBTQIA+ em razão da obrigatoriedade da nova carteira trazer o nome de registro como principal, mesmo quando a pessoa já utiliza um nome social em seus documentos atuais. Segundo essas instituições, o RG fere a dignidade da população trans. A pessoa que apresente um gênero de registro não correspondente a sua identidade de gênero poderão ser expostas. A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão do MPF já expediu uma nota técnica apontando que a nova identificação, aprovada pelo decreto 10.977/22, viola os direitos humanos(https://www.migalhas.com.br/quentes/377743/mpf-nova-carteira-de-identidade-estimula-violacao-de-direitos-humanos#:~:text=O%20novo%20modelo%20de%20Carteira,do%20Cidad%C3%A3o%2C%20%C3%B3rg%C3%A3o%20do%20MPF.).
Não é de admirar que um governo pouco afeito a políticas de proteção da comunidade LGBTQIA+ determine a produção de um documento de identidade que atenta contra essa parcela da população. No entanto, os problemas referentes à produção da CIN não se restringem à violação de direitos humanos – o que, por si só, já é extremamente grave. Nos últimos dias, surgiram na imprensa informações que apontam vários pontos controversos nos requisitos de segurança para a produção do documento. Essas normas foram fixadas pela Câmara Executiva Federal de Identificação do Cidadão (Cefic), órgão subordinado à Secretaria Especial de Modernização do Estado, comandada pelo Oficial do Exército Eduardo Gomes da Silva. Ambas estão debaixo do ministro da Secretaria Geral da Presidência da República, general Luis Eduardo Ramos. O processo de regulamentação da carteira se arrasta desde fevereiro, quando o decreto 10.977/22 foi publicado. No entanto, subitamente o governo Bolsonaro passou a conduzir a questão em caráter de “urgência urgentíssima”, atropelando uma série de etapas com o objetivo de estabelecer as novas regras nos estertores do seu mandato (https://relatorioreservado.com.br/noticias/ha-estranhas-digitais-na-carteira-de-identidade-nacional/).
Algumas das propostas discutidas no âmbito da Cefic são, no mínimo, estranhas. A começar pela vedação da formação de consórcios para a confecção da carteira. A ideia é que todas as etapas fiquem a cargo de uma única empresa e sejam desenvolvidas em uma mesma unidade fabril. São poucas as empresas que conseguiriam atender a essa exigência, casos da Valid e da Thomas Greg do Brasil. As restrições à composição de consórcios é extremamente inusitada, para se dizer o mínimo. Ou seja: caso a norma seja implantada, os órgãos de identificação dos estados – secretarias de segurança, Detrans etc – serão obrigados a contratar um único fornecedor, concentrando em uma só empresa os valores pagos pelo serviço. Não se sabe se é um caso para o TCU ou para os órgãos antitruste. Talvez para os dois.
As informações são de que o atual governo não levou à equipe de transição informações detalhadas sobre as discussões conduzidas dentro da Cefic. Ainda que o presidente Jair Bolsonaro venha a sancionar qualquer resolução ou novo decreto com os requisitos para a produção da nova identidade – consequentemente estabelecendo condições para a contratação dos fornecedores de serviços -, espera-se que a medida seja revogada pelo governo Lula. A suspensão de qualquer decisão daria tempo não só para ajustes nas normas como também para o MPF apurar eventuais suspeições que cercam a elaboração das regras e também as graves acusações de violação dos direitos humanos. Permitiria também a mudança dos atuais integrantes da Cefic. Por um lado, seria uma forma de garantir a lisura do processo e, por outro, de evitar o que as entidades de defesa da comunidade LGBTQIA+ classificam como uma “humilhação” perpetrada pelo atual governo (https://www.uol.com.br/universa/noticias/redacao/2022/10/27/novo-rg-por-que-entidades-lgbt-querem-acabar-com-documento.htm).

Redação

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