Jogo Sujo

A estranha indicação do ministro Tarcísio de Freitas para a ANTT

Ex-deputado Arnaldo Silva Junior)

A indicação de um apadrinhado político para a diretoria da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), por definição um cargo técnico, gerou surpresa e mal-estar em Brasília. O eleito, Arnaldo Silva Júnior, é diretor municipal do DEM em Uberlândia (MG) e funcionário de gabinete do senador Rodrigo Pacheco, do mesmo partido. Segundo o Palácio do Planalto, a escolha partiu do próprio ministro da Infraestrutura, Tarcísio Freitas. Pacheco é o candidato de Jair Bolsonaro à presidência do Senado. Talvez o agrado se “explique” sob essa ótica tortuosa. O que não tem justificativa é Freitas indicar para a ANTT um assessor direto de um herdeiro de empresas de ônibus em Minas Gerais, caso de Pacheco.

A Lei das Agências Reguladoras não deixa margem para dúvidas ao proibir, claramente, a indicação de “dirigentes partidários” e “pessoa que tenha atuado, nos últimos 36 meses, como participante de estrutura decisória de partido político ou em trabalho vinculado a organização, estruturação e realização de campanha eleitoral”.

A Secretaria-Geral da Presidência, órgão responsável por analisar os atos jurídicos do governo, ratificou que foi o próprio ministro Tarcísio de Freitas quem encaminhou o nome de Arnaldo Silva Júnior. A Secretaria ainda informou não ter competência para fazer a reanálise de “possíveis vedações” após o Ministério de Infraestrutura ter avalizado o nome de Silva Junior, mas que poderá retirar a indicação:

“De todo modo, uma vez confirmada qualquer violação à Lei Geral das Agências, a Presidência da República publicará a retirada da indicação”, informou a Secretaria à imprensa.

Apesar de violar os dispositivos da lei, o nome do ex-deputado estadual Arnaldo Silva Júnior chegou a ser aprovado no dia 14 de dezembro pela Comissão de Infraestrutura do Senado, que também realizou a sabatina do candidato. Porém, a indicação ainda precisa passar pelo plenário da Casa.

O objetivo das restrições previstas na Lei das Agências Reguladoras é evitar que processos de caráter técnico sejam contaminados por influência política. Se for confirmada a indicação, Arnaldo Silva Júnior poderá, por exemplo, analisar as taxas de pedágio cobradas nas rodovias e o tabelamento do frete no país.

O diretor da ANTT também pode autorizar o funcionamento de novas linhas para transporte de passageiros – motivo de disputas entre o governo e o Senado. Enquanto integrantes do governo federal querem abrir o mercado para novas empresas, alguns senadores, herdeiros de empresas tradicionais, preferem fechar os acessos a competidores.

Saiba quem é Rodrigo Pacheco, padrinho político do indicado e herdeiro da Viação Real

O senador Rodrigo Pacheco, padrinho político do indicado, é um exemplo desses herdeiros na política. Filho do proprietário das empresas de transporte de passageiros Santa Rita e Viação Real, ele foi um dos maiores incentivadores do projeto de lei que reduz a concorrência no transporte rodoviário interestadual de passageiros (TRIP), aprovado no último dia 15 de dezembro pelo Senado. O relator do PL, por sua vez, foi outro herdeiro: o senador Acir Gurgacz (PDT-RO), cujos familiares são donos das empresas Eucatur e Solimões.

O próprio senador Pacheco afirmou que a indicação dele à ANTT foi uma iniciativa do Ministério da Infraestrutura, comandada por Tarcísio de Freitas.

“O indicado é uma recomendação do Ministério da Infraestrutura, responsável pela avaliação dos requisitos à função. Não há interesse pessoal meu algum na indicação”, disse, por meio de sua assessoria.

Infraestrutura coleciona promessas não cumpridas desde 2019

A nebulosa indicação de Arnaldo Silva Junior para a ANTT é mais um ponto negativo no currículo de Tarcísio Freitas, já chamado por seus pares de “ministro das promessas não cumpridas”. Desde o início do governo Jair Bolsonaro, Freitas tem sido alvo de críticas pela profusão de projetos anunciados que não saem do papel.

Os principais críticos reclamam que a cada ano são anunciadas medidas para o ano seguinte, como os 50 leilões de rodovias, ferrovias e portos, prometidos para 2021. Fala-se em investimentos da ordem de R$ 140 bilhões e na geração de mais de 2 milhões de empregos. Até o final do governo Bolsonaro, segundo o ministro Tarcísio de Freitas, os investimentos “vão ser” de R$ 260 bilhões.

No entanto, ao longo de todo 2020, não foi feito nenhum leilão nem efetuada nenhuma das concessões prometidas ainda em 2019. Por essas e outras, o Ministério da Infraestrutura ganhou o apelido de “Ministério do Vai Fazer”.

Redação

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